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Durante muito tempo tentei compreender as palavras das opiniões de meu amigo Cesário a respeito da perenidade da Beleza. Hoje tento fazê-lo por suas imagens...
O corpo humano e a beleza corporal são temas frequentes nessas fotografias que aspiram captar o imutável no transitório, o abstrato no concreto, o divino no profano -- em suma, nelas o Eterno se encarna. O problema é saber se ele o faz definitiva ou provisoriamente. O que é o mesmo que perguntar se, ao abandonar novamente o corpo, a Beleza o terá transtornado. E, caso afirmativo, em que o transforma. Nas imagens de Cesário a junção do universal com o particular parece sempre poder inserir-se numa narrativa, ainda que nem sempre se nos apresente claramente se a história começa desta junção ou se é apenas uma condição, ocasião ou álibi para ela. O que faz aquela moça a flutuar em águas tão límpidas? Em que narrativa se insere? Como ela veio a chegar aí? De onde vinha e o que procurava? Ofélia a embriagar-se mortalmente da loucura de Hamlet? Ou alguma mulher anônima a flutuar, quase a dormir, numa tarde de veraneio qualquer enquanto o manto das águas languidamente a refresca e acalanta? Quiçá não haja mesmo diferença entre morrer e dormir, exceto a interintradutibilidade dos respectivos sonhos:

 

Dormir, talvez sonhar... Aqui reside o problema:
Que sonhos pode trazer o sono da morte.

 

WALDÍSIO ARAÚJO

9 Em pizza.jpg

E que são essas séries tão apropriadamente batizadas de "estorietas", impressionantes como saltos-triplos de deuses sobre a Terra? Parecem unir instantes -- a rigor independentes entre si -- em sucessões de início, meio e fim que delimitam meros segmentos da reta do possível. E esta reta não teve começo nem terá final e sem Cesário poderia mesmo jamais ter passado por ali. Muitas histórias já atravessaram e atravessarão a Torre de Pisa. Sem elas sequer haveria Torre de Pisa. E esta pode mesmo desabar amanhã, tanto faz: seria ainda algo infinito, permanente e indestrutível em cada uma das três fotografias e na série em que elas se procuraram, ainda que as negássemos três vezes três vezes esta e aquelas. Um Deus não precisava ter criado o universo: bastar-lhe-ia fazer a luz para que fosse possível a fotografia de Marcos Cesário... e em seguida deixar que este dormisse e sonhasse com o salto-triplo divino cujas marcas no solo fotografaria no exato instante do seu despertar. E ter-se-ia feito corpo e carne e sólido e perene um belo mundo.

 

 

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